O Brasil se prepara para dar um passo inédito na rastreabilidade dos rebanhos bovino e bubalino. Com o lançamento do Plano Nacional de Identificação Individual de Bovinos e Búfalos (PNIB), do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), cada animal passará a ter um código de identificação único, válido em todo o território nacional. A medida torna o controle sanitário mais preciso, amplia a transparência na rastreabilidade e eleva a competitividade da pecuária brasileira no cenário global.
Na prática, será como criar uma “carteira de identidade” – e também um “passaporte” – para cada bovino e bubalino, reunindo informações sobre origem, manejo e deslocamentos ao longo da vida do animal em uma plataforma unificada. A implementação será gradual, com prazo até 2032. Os pecuaristas serão os responsáveis por registrar os dados na plataforma, incluindo número de animais, movimentações e vacinação.
A identificação individual representa um avanço na capacidade do país de responder rapidamente a emergências sanitárias. A nova ferramenta responde às exigências de mercados internacionais mais rigorosos, além de reforçar a segurança alimentar.
A retirada da vacinação contra a febre aftosa no Brasil tornou ainda mais urgente a adoção de ações rápidas e eficazes de controle sanitário. A identificação individual dos animais é uma medida estratégica para reforçar a credibilidade da nossa produção, abrir novos mercados e garantir a sanidade do rebanho.
Ágide Eduardo Meneguette, presidente interino do Sistema FAEP
Nos dois primeiros anos, o foco será o desenvolvimento de um sistema informatizado em âmbito federal e a integração das bases estaduais. A partir de 2027, animais que passarem por manejo sanitário ou forem incluídos em protocolos privados serão identificados. Em 2030, a exigência será estendida a todos os animais movimentados fora das propriedades, permitindo a rastreabilidade completa do rebanho, que torna-se obrigatória após 2032.

Vigilância reforçada no Paraná
A nova medida representa ganhos para o Paraná, que possui um rebanho de cerca de 8,5 milhões de cabeças, distribuídas em 170 mil propriedades. Com a identificação individual, a Agência de Defesa Agropecuária do Paraná (Adapar) passará a contar com dados mais precisos, ganhando agilidade para agir em situações de risco sanitário.
Hoje, o controle é feito por lotes, por meio da Guia de Trânsito Animal (GTA). Embora funcione no Paraná, esse modelo ainda apresenta limitações em situações que exigem respostas rápidas, como surtos epidemiológicos. “A rastreabilidade por lotes não oferece a precisão necessária em casos de doenças de alto risco. Muitas vezes, a movimentação de um único animal pode representar um risco sanitário, e sem saber sua origem exata, o tempo de resposta fica comprometido”, explica Rafael Gonçalves Dias, gerente de Saúde Animal da Adapar.
Além de fortalecer a vigilância, a identificação individual atende diretamente às exigências comerciais internacionais.
Trata-se de uma resposta a um mercado global cada vez mais rigoroso quanto à origem e ao bem-estar dos animais. Países como Japão, Coreia do Sul e China já exigem esse tipo de controle para importar carnes, inclusive suína. Portanto, estamos falando de um investimento na competitividade da pecuária brasileira.
Rafael Gonçalves Dias, gerente de Saúde Animal da Adapar
A nova ferramenta também muda a lógica dos protocolos de emergência sanitária. Atualmente, diante da ocorrência de doença grave, o Mapa adota o autoembargo, suspendendo as exportações em todo o território. Com um sistema robusto de rastreabilidade individual, a resposta poderá ser localizada, restringindo a medida apenas à região afetada.
“O controle detalhado permite identificar e isolar rapidamente os focos de doença, facilitando a retomada do status sanitário do país. Isso também oferece mais transparência para os mercados compradores e evita medidas mais drásticas como o autoembargo”, acrescenta o gerente da Adapar. Além dos ganhos em biosseguridade e competitividade, a medida tende a beneficiar diretamente os produtores rurais, aprimorando o manejo e a gestão das propriedades. “Com dados individualizados, será possível melhorar a gestão zootécnica, acompanhar com mais precisão o desempenho do rebanho e tomar decisões mais assertivas sobre nutrição, sanidade e reprodução”, conclui Dias.
Cronograma de implementação
2025: Desenvolvimento do sistema informatizado e da Base Central de Dados em âmbito federal.
2026: Adequação dos sistemas e bases de dados dos órgãos estaduais à plataforma nacional.
2027/29: Início da identificação individual de bovinos e búfalos que passarem por manejo sanitário (vacinação contra brucelose conforme o Programa Nacional de Controle e Erradicação de Brucelose e Tuberculose Animal) e que forem incluídos em protocolos privados, homologados ou não pelo Mapa.
2030/32: Identificação, antes da primeira movimentação, de todos os animais que, independentemente do motivo, transitem em território nacional.
Como vai funcionar a identificação?
O sistema brasileiro de rastreabilidade seguirá as normas da Organização Internacional para Padronização (ISO). Cada animal receberá um código único, composto pelo prefixo 076 (código ISO do Brasil) e mais 12 dígitos numéricos.
Os números serão gerados pela Base Central de Dados de Identificação Animal e a identificação será obrigatória antes da primeira movimentação. Sem ela, não será possível emitir a GTA.
Os dispositivos de identificação oficiais serão amarelos, invioláveis e não reutilizáveis. Os modelos previstos são:
– Brinco tipo bandeira + botton (sem chip);
– Brinco eletrônico;
– Botton eletrônico;
– Brinco tipo bandeira + botton (um deles com chip).
Sistema FAEP tem papel fundamental na adaptação dos pecuaristas
A partir de 2026, os Estados terão o prazo de um ano para adequar seus sistemas de identificação, que deverão ser integrados à base de dados nacional. No Paraná, esse processo será construído em parceria com o setor produtivo e o governo estadual.
“O grande desafio é integrar os sistemas estaduais ao federal, garantindo que as informações sobre a movimentação de animais conversem. O Brasil é um país continental, com realidades distintas entre os Estados, e essa integração será fundamental para que a rastreabilidade funcione de forma eficiente. Por isso, o processo será conduzido com cautela, de forma gradual e acompanhado de ações de orientação aos produtores”, pontua Rafael Gonçalves Dias, gerente de Saúde Animal da Adapar.
A predominância das pequenas propriedades no Paraná deve facilitar a adaptação às novas exigências. Outro ponto favorável é o Programa Pecuária Moderna, iniciativa do Sistema FAEP voltada ao aumento da produtividade e da qualidade da bovinocultura de corte no Estado. De acordo com Fábio Mezzadri, técnico do Departamento Técnico e Econômico (DTE) da entidade, os pecuaristas que participam do programa já adotam práticas avançadas de manejo e controle sanitário, como dietas nutricionais específicas, vacinações, uso de medicamentos, registros de nascimentos, dados reprodutivos e ganho de peso.
“Para esses produtores, a adesão ao sistema nacional de rastreabilidade tende a ser mais tranquila, uma vez que muitas das práticas preconizadas pelo programa já fazem parte da rotina das propriedades. Esse cuidado é essencial para a produção de uma carne de alto padrão, que é justamente o objetivo do Pecuária Moderna”, resume Mezzadri.
O presidente da Comissão Técnica (CT) de Bovinocultura de Corte do Sistema FAEP, Rodolpho Botelho, também destaca o papel estratégico do colegiado na preparação do setor para a futura realidade.
A Comissão Técnica, junto com o Sistema FAEP, tem a missão de orientar os produtores sobre as novas exigências, assegurando a transição gradual, eficiente e sem burocracia excessiva. Nosso objetivo é garantir uma rastreabilidade de qualidade, que seja acessível ao produtor rural, sem dificultar sua adesão ao sistema.
Rodolpho Botelho, presidente da CT de Bovinocultura de Corte do Sistema FAEP
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