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Rotação de cultura é alternativa lucrativa para produtor de grãos

Atraso no plantio da soja no ano passado fez janela do milho safrinha ficar estreita em algumas regiões do Paraná, um aparente problema que pode ser oportunidade

Os benefícios da rotação de cultura abrangem diversos campos, da conservação do solo à quebra do ciclo de pragas e doenças e até mesmo de reflexo direto na receita das lavouras. Especificamente nesse último aspecto, de mais dinheiro no bolso, em geral os benefícios de diversificar os cultivos levam algum tempo, mas aparecem. O produtor rural Fabio Schmidt, de Ponta Grossa, nos Campos Gerais, está ganhando dinheiro anualmente, além de ajudar colegas da região a diversificarem seus cultivos. Tudo isso com uma planta incomum: o trigo mourisco.

E não é de hoje. Já são 10 anos no negócio, com um investimento de mais de R$ 13 milhões. O valor foi dedicado a construir uma planta para beneficiar sementes do produto, a serem vendidas a outros agricultores, e também para processar a colheita de produtores locais. Hoje, nas contas de Schmidt, são cerca de 5 mil hectares no Estado dedicados ao trigo mourisco.

“A gente viu um potencial bastante bom de busca por sustentabilidade pelo produtor, que possibilite a rotação de cultura e com geração de renda. Foi então que encontramos o trigo mourisco, que tem um espaço para exportação para países asiáticos, sobretudo o Japão”, revela Schmidt.

O produto, hoje, tem um rendimento em torno de 1,5 tonelada por hectare e um preço de cerca de R$ 700 a tonelada. “É um cultivo que pode ser integrado em diversos sistemas produtivos, pois tem ciclo em torno de 80 dias. Além dos benefícios da rotação, também suprime bastante ervas daninhas e não tem problema com pragas e doenças. Você fica todo o período sem entrar com químicos na área. Era o que buscávamos, uma planta que tivesse vantagens agronômicas e que, ao mesmo tempo, tivesse o pilar econômico”, compartilha o produtor.

Médio e longo prazo

Em Mangueirinha, na região Sudoeste do Paraná, o agricultor Laercio Dalla Vecchia mostra um outro lado, um pouco mais conhecido, mas nem sempre praticado pelos produtores. “Muitas vezes a gente acha que está fazendo uma coisa boa em plantar a safrinha. Realmente, na época certa, é uma ótima aposta. Mas se a gente dividir nosso pedaço em cinco, e abrir mão da safrinha em um destes pedaço para fazer palha, no outro ano, se olhar num contexto total dentro sua propriedade, pode ter certeza que os resultados econômicos vão ser melhores”, recomenda.

Graças ao investimento em rotação de cultura e em boas práticas que vem fazendo nos seus 170 hectares nos últimos três anos, na safra atual, Dalla Vecchia colheu a soja mais rentável de toda sua vida. “Tenho áreas onde estão me sobrando mais de 60 sacas de soja por alqueire de lucro. Isso pagando todos os mix de cobertura, adubo, calcário e insumos usados na cultura”, comemora. “O resultado vem no bolso. Só com as economias com inseticidas que não precisei passar já deu pra marcar uma viagem com a família para o Nordeste”, compartilha.

Oportunidade para rotacionar

A falta de chuva entre setembro e outubro de 2019 em algumas regiões do Paraná, em especial no Oeste, fez o plantio da soja sofrer um atraso entre duas e três semanas em relação à média dos últimos anos. Como não podia ser diferente, a situação se reflete agora no ritmo de colheita. Na temporada 2018/19, na semana do dia 11 de fevereiro, 33% das áreas com soja já tinham sido colhidas. Na safa atual, até agora, 4% da área total com a oleaginosa foram colhidos, o que equivale a cerca de 270 mil hectares dos 5,46 milhões de hectares semeados.

A preocupação maior ocorre principalmente para os produtores do Oeste, que devem ficar com a janela de plantio do milho safrinha bastante apertada. De acordo com o Departamento de Economia Rural (Deral) da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Paraná (Seab), a região deve diminuir em torno de 8% a área dedicada ao cereal na safra de inverno. “A gente não pode afirmar que o produtor não vai plantar”, relativiza o técnico do Deral Edmar Gervásio. “O que temos de concreto é que há esse atraso e a estimativa é de uma redução de área do milho segunda safra no Oeste. Mas ainda não é possível afirmar com certeza”, prevê.

No papel, a janela de plantio prevista no Zoneamento Agrícola de Risco Climático (Zarc) deve permitir o plantio do milho após a colheita da soja. O problema, no entanto, são as questões agronômicas. Afinal, quanto mais próximo do inverno, menor será a incidência solar, podem ter desenvolvimento mais lento e ficarem mais vulneráveis a possíveis ondas precoces de frio.

“O pessoal do Oeste do Paraná relata que o milho plantado na primeira quinzena de fevereiro vai muito melhor do que aquele que é semeado nas duas últimas semanas do mês ou no início de março”, compartilha Ana Paula Kowalski, do Departamento Técnico Econômico (DTE) da FAEP.

Com o preço do milho atrativo, próximo da casa dos R$ 40 a saca, é possível que boa parte dos produtores arrisque plantar, mesmo em um cenário longe do ideal. Flaviane Medeiros, técnica do Departamento Técnico (Detec) do SENAR-PR, no entanto, lembra que essa pode ser a oportunidade para o produtor fazer uma boa rotação de culturas. “Muitas vezes o produtor olha com um viés imediatista para a lavoura e esquece de todos os benefícios a médio e longo prazos que uma boa rotação de culturas promove no solo, desde aspectos de conservação e quebra do ciclo de pragas e doenças e no próprio aumento da receita”, alerta.

Mudança de mentalidade

Ana Paula Kowalski pontua que, para haver uma mudança de mentalidade, é necessário que o produtor foque além da rentabilidade de curto prazo. “O principal pilar do sistema de plantio direto é a rotação de culturas, certamente o mais difícil aspecto deste manejo. A rotação de culturas exige planejamento de curto, médio e longo prazos, não só da produção, mas também financeira por parte do produtor rural. Isso porque nem sempre as espécies vegetais que compõem a rotação são comercialmente rentáveis”, diagnostica.

Para o pesquisador Henrique Debiase, da Embrapa Soja, os principais benefícios trazidos pela rotação de culturas estão na melhoria da estrutura e na redução da compactação do solo. “A rotação permite maior infiltração e armazenamento de água e também maior desenvolvimento radicular das culturas econômicas. Tudo isso resulta em aumento de produtividade e aumento da eficiência do uso de insumos, com impactos positivos na rentabilidade. Além disso, essa melhoria na estrutura do solo reduz o impacto ambiental das atividades agrícolas, principalmente no que se refere aos processos de erosão”, ensina.

Debiase cita ainda os números de pesquisas que analisam índices de produtividade e de economia nos custos de produção. “Espera-se um aumento de até 15% na produtividade de todas as culturas de grãos cultivadas no sistema de produção. Há ainda uma redução no custo com o controle de ervas daninhas resistentes ao glifosato. Temos dados de campo mostrando que a produção de palha no sistema diversificado da produção de grãos pode representar uma economia de R$ 150 por hectare por ano no uso de herbicidas”, explica.

Iapar estuda rotação de cultura

O Instituto Agronômico do Paraná (Iapar) promove estudos específicos sobre a rotação de cultura em Ponta Grossa, nos Campos Gerais. São diversos campos experimentais para testar diferentes combinações de culturas e técnicas de manejo. De três anos para cá, a instituição passou a ter o apoio da chamada Rede Paranaense de Agropesquisa, iniciativa do Sistema FAEP/SENAR-PR.

A rede faz um trabalho específico de pesquisa para testar possíveis sistemas de rotação. Lutécia Beatriz Canalli é uma das pesquisadoras à frente desse trabalho. “Todas as opções que colocamos de rotação apresentam resultados melhores do que a sucessão de culturas trigo- -soja, que é a mais comum na nossa região”, aponta.

Ainda, para a pesquisadora, no sistema de rotação de cultura é preciso pensar no mínimo em um ciclo de três anos. “A rotação precisa ser pensada em conjunto. No ano a ano, pode haver o ganha-perde. Mas só assim se constrói solo e aí é que se chega à composição do ganho do produtor. Essa forma de pensar é que temos que começar a mudar”, conclui.

Leia a matéria completa e todos os infográficos no Boletim informativo.

Felippe Aníbal

Jornalista profissional desde 2005, atuando com maior ênfase em reportagem para as mais diversas mídias. Desde 2018, integra a equipe de comunicação do Sistema FAEP/SENAR-PR, onde contribui com a produção do Boletim Informativo, peças de rádio, vídeo e o produtos para redes sociais, entre outros.

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